Sabe, as mães deveriam durar para sempre. Sempre, para sempre, repito, sempre. Seus olhares cautelosos, sedosos, zelosos, a velar os sonos, os sonhos, os enganos. A cuidar das vestes, dos ciúmes, dos amores.
Mãe que é mãe é assim: patrimônio histórico da humanidade de um só. Paro por um minuto, olho e vejo o dito, analiso minuciosamente cada palavra: é muito egoísmo, meu Deus, prender uma vida a outra, com a pretensão de simplesmente ser servido de seus favores. Mas, é não menino. É bom demais ser mimado, cuidado, zelado. E essa falsa sensação de que o mundo todo piora com a sua ausência.
Passaram dias, meses, anos. Passou, tudo passa, menos a saudade.
Zelosa, percorro em mim as centelhas de vida que escorrem de minhas lembranças. Doces, doces recordações de um tempo em branco e preto, tempo este que colore de azul anil a esperança de dias melhores.
E passeia em mim a essência do amar, mas ainda enraizadas as pretensões infantis de permanência eterna do que se foi, de quem partiu. E se foi, na doce melancolia destes dias de outono, nas folhas caídas, no problemas mal resolvidos, nos assuntos inacabados lá está: seria melhor se estivesse aqui, penso eu, neste engano bom trazido pela sensação de proteção perdida.
O dia começa. O sol nasceu, mas do que vejo, sinto! A audácia dos encantos de permanecer de pé durante todo o dia, e adormecer feliz na noite, no perdão dos sinceros e contritos. E na vida, nos percalços, falto os ensaios das minhas esquetes, nas demoras de minhas perfeições. Mas igual Adélia, tem horas que vem tudo de fora, mas, na certeza da natureza de meus instintos, sei que na hora certa, o certo sei fazer, fazendo bem feito.
"Tinha vantagens não saber do inconsiente.
Vinha tudo de fora!
Maus pensamentos, tentações, desejos...
Contudo, ficar sabendo foi melhor.
Estou mais densa: tenho âncora.
Paro em pé por mais tempo.
De vez em quando, ainda fico oca.
O corpo hostil e Deus bravo, mas passa logo!
Como um pato sabe nadar sem saber,
sei sabendo que na hora "H" nado com desenvoltura...
Guardo sabedorias no almoxarifado".
* Adélia Prado.
Vinha tudo de fora!
Maus pensamentos, tentações, desejos...
Contudo, ficar sabendo foi melhor.
Estou mais densa: tenho âncora.
Paro em pé por mais tempo.
De vez em quando, ainda fico oca.
O corpo hostil e Deus bravo, mas passa logo!
Como um pato sabe nadar sem saber,
sei sabendo que na hora "H" nado com desenvoltura...
Guardo sabedorias no almoxarifado".
* Adélia Prado.
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