21 de setembro de 2010

Ser!

Engraçada a capacidade que temos de desistir de nós pelos outros, pelos dizeres e apontamentos. Sabemos quem somos, ou, pelo menos, pensamos que sabemos quem somos. Mas, se vem o outro e diz: eu não acredito em você, pisamos falso. É fato: a dúvida do outro gera questionamentos em mim. Fruto bom, se dado a devida cautela e buscado dentro de uma lógica ímpar de considerações posteriores: há controvérsias, das mais variadas e para  todos os paladares.
Nascida de atitudes não muito coerentes, talvez desavisadas, as incompreensões geram transtornos por muito irrevogáveis se não tratados de forma respeitosa. Ancorar porto nas diferenças sem persuadílas em nosso favor. A sempre vítima torna-se a humilde presença da desculpa que deixou de ser esfarrapada para virar perdão, graça e festa, por fim.
Não obstante, a graça engraçada pela vivência sincera de um coração derramado no prazer da obediência franca e leal aos ensinamentos precedentes, nascidos do saber viver: não mais escancarando vontades, mas enraiando cumplicidade ao Autor da teoria e prática. Questiona-se o primeiro pela falta do segundo, desculpando a ausência do último pelo outro, e voltamos ao ponto de partida. Afinal, viveria eu algo não vivido por outrém? Sim, claro que sim. De que adianta alcançar alto mar sem calcular o fôlego necessário para minha empreita? De que adianta alçar vôo rapidamente se sei que somente chegarei ao destino com outros a ajuntar força e precisão? O que falta em mim encontro ao lado, vice-versa. Porquanto devolvo, pela graça recebida, o dom desprendido aos meus cuidados, meu zelo. Se de forma certa? Não sei. Mas da forma de meus encantos, meus entendimentos e desdobramentos da minha alma. Afinal, existiria um jeito certo?
Entretando, uma só coisa tenho em certeza: a submissão é fruto do sofrimento amadurecido na mortificação de uma grande e até então irresistível vontade, em ganho não mais do controle de si, mas do domínio das inconstâncias em detrimento à subversidade gritada pela libertinagem, pois pensando bem, somente se vence a última no viver desprendido de aclamadas afirmações e averbações, afinal "a alma que busca a Deus e permanece em seus desejos e comodismo, busca-o de noite e, portanto, não o encontrará. Mas quem o busca através das obras e exercício da virtude, deixando de lado seu gosto e prazeres, certamente o encontrará, pois o busca de dia" (São João da Cruz).
Gritar clama escândalo, agir prova Deus. Escolhamos viver...

2 de setembro de 2010

É, não dá mesmo pra voltar...

Impropriedade. Qualidade do que é impróprio, que está fora da conjuntura normal do ser em que reside. Incoveniência, incorreção. Deslocamento... Decerto, somente reconhece uma impropriedade aquele que conhece o próprio, a propriedade em si, em todas as suas plenitudes e horizontes. Somente se reconhece desmerecedor do merecimento quem reconhece em si suas inadequações ao adequado, ao irrepreensível. Somente confessa a imperfeição quem reverencia o que é perfeito, pois o esmiuçou em cada pormenor, cada particularidade.  O mais constrangedor de tudo é que o que é posto não é imposto, mas brota do desabrochar de conhecer-se e ser conhecido, sem, no entanto, restarem cobranças. Os merecimentos nascem de desmerecimentos, e se transformam em graça, percetível desarranjar de ato pretérito que venceu o que quis ser, e por vezes sou e outras, nem tanto. Os desajustes, também comparados ao Incomparável, são sementes de joelhos dobrados que, sem saber, buscaram a posição certa de estar ao Sol. Afinal, busquei, sempre buscamos algo, sempre queremos algo. Sempre estaremos, mesmo sem saber, envoltos a pedidos e milagres, os pequenos absurdos cotidianos e incoerências humanas. Incorreção à mim, perfeição do querer em Deus... Ademais, administrar esse monte de querer junto, sem mexer na vontade humana, meu Deus... só Tu mesmo.
Voltar atrás sem querer ficar por lá. Olhar a paisagem que ficou, sem desejar ostentá-la. A beleza não reside somente no que vejo pela frente, afinal as águas profundas são turvas e retiram o direito de minhas pupilas enxergarem com clareza a limpidez com que a margem se apresenta. As ondas são mais seguras, afinal a terra firme me calça os pés. A sombra do coqueiro, o alimento fresco e à mão, os velhos amigos, os velhos hábitos, as sempre seguranças, os até então eternos costumes... E os sentimentos continuam a fazer maré contrária, com revência à senhora vontade. Outrossim, o que me chama diz que me ama, e esse Amor eu conheci, e que será o vento na medida do que apresento. Me dará as redes e me dirá o local, porém lançá-la dependerá de mim. Posso chamar outros à minha labuta. Posso pedir ajuda. Posso, tudo posso. Por fim, tudo depende de mim. Ir ou vir. Ficar, me afogar, nadar, navegar, tudo, absolutamente tudo, depende de mim: do que eu entrego e do que eu resguardo. Acreditar ou não, em sua palavra. Ser obediente ou não, aos seus pedidos. Ser fiel ou não às suas promessas. Aqui, não cabem condenações. Mas reconhecimento de quem sou, e de quem Ele é. E saber que nem sempre o caminho curto é o mais fácil, e nem sempre o caminho de pedras é mais difícil... nem sempre o alto mar é assustador: depende de quem te acompanha na viagem...