9 de novembro de 2011

Pedra no caminho


As frases se mostram em santos, e não passam de linhas, em amotoado de palavras com sentido e sem sentimento em mim. Não se demoram em suas intenções, não se prologam em virtudes, não se apoderam de minh'alma. Apenas passam, como uma bela paisagem na estrada que percorro "às carreiras". E essa pressa? Só Deus. Só Ele sabe as urgências que insistem em concorrer com a minha paz. Enquanto isso, as atitudes sem sentido irritam até o esgotar de toda a minha impaciência, visto que a paciência já se foi a muito tempo, como um teste ao qual sou fadada ao fracasso, sempre.
E o tempo. Castiga soberano e imponente todos os sonhos e projetos, sonhos meus. Passam dias, meses e estações inteiras, passando, passam. E me vejo em uma esteira, a ser levada pelas circunstâncias, ao invés de fazê-las acontecer, e até isso esqueço, na ciranda do viver. E até disso, não sinto mais sabor.
Acho que aconteceu: o desabor voltou. Não sinto prazer em nada. Esse perigo de não me reconhecer em minha criação, e não me reconhecer como criatura encaixada em nenhuma moldura posta, imposta ou proposta. E os perigos de não me reconhecer se mostram como monstrom do seriado da TV.
Assim, respiro não tão alivida, quando até Adélia diz: "Deus de vez em quando me tira a poesia: olho para uma pedra e vejo uma pedra".  Se para crer passamos pela descrença, descrendo, creio, mesmo que as minhas pedras sejam mais que beleza, alcancem o desastre de rolar montanha abaixo e insistem em atrapalhar todo o caminho.

8 de novembro de 2011

Quero a minha mãe.


Sabe, as mães deveriam durar para sempre. Sempre, para sempre, repito, sempre. Seus olhares cautelosos, sedosos, zelosos, a velar os sonos, os sonhos, os enganos. A cuidar das vestes, dos ciúmes, dos amores.
Mãe que é mãe é assim: patrimônio histórico da humanidade de um só. Paro por um minuto, olho e vejo o dito, analiso minuciosamente cada palavra: é muito egoísmo, meu Deus, prender uma vida a outra, com a pretensão de simplesmente ser servido de seus favores. Mas, é não menino. É bom demais ser mimado, cuidado, zelado. E essa falsa sensação de que o mundo todo piora com a sua ausência.
Passaram dias, meses, anos. Passou, tudo passa, menos a saudade.
Zelosa, percorro em mim as centelhas de vida que escorrem de minhas lembranças. Doces, doces recordações de um tempo em branco e preto, tempo este que colore de azul anil a esperança de dias melhores.
E passeia em mim a essência do amar, mas ainda enraizadas as pretensões infantis de permanência eterna do que se foi, de quem partiu. E se foi, na doce melancolia destes dias de outono, nas folhas caídas, no problemas mal resolvidos, nos assuntos inacabados lá está: seria melhor se estivesse aqui, penso eu, neste engano bom trazido pela sensação de proteção perdida.
O dia começa. O sol nasceu, mas do que vejo, sinto! A audácia dos encantos de permanecer de pé durante todo o dia, e adormecer feliz na noite, no perdão dos sinceros e contritos. E na vida, nos percalços, falto os ensaios das minhas esquetes, nas demoras de minhas perfeições. Mas igual Adélia, tem horas que vem tudo de fora, mas, na certeza da natureza de meus instintos, sei que na hora certa, o certo sei fazer, fazendo bem feito.

"Tinha vantagens não saber do inconsiente.
Vinha tudo de fora!
Maus pensamentos, tentações, desejos...
Contudo, ficar sabendo foi melhor.
Estou mais densa: tenho âncora.
Paro em pé por mais tempo.
De vez em quando, ainda fico oca.
O corpo hostil e Deus bravo, mas passa logo!
Como um pato sabe nadar sem saber,
sei sabendo que na hora "H" nado com desenvoltura...
Guardo sabedorias no almoxarifado".
* Adélia Prado.